quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Borá

Sentou-se na cadeira de balanço puxada cuidadosamente por seu marido, encostou-se completamente naquele espaço, pôs as mãos nos apoios, recostou a cabeça e prosseguiu a balançar-se de um lado para o outro. O homem, como de costume, catou o banquinho da cozinha e ali mesmo, sem encosto pro corpo cansado, sentou-se. Puseram os dois a trocar umas ideias calejadas pelo tempo, umas lembranças meio embaçadas, uns sorrisos realmente alegres, a voz de um confortando o outro, como um colo macio, que se deita quando se está doente de amor. Não faz nem muito esse tempo, o passado ainda está ao lado, tomam o seu café da manhã juntos. Um olha para o outro como a alguns anos atrás, os rostos modificados pelo cotidiano, a beleza acentuada, nos corpos usados. O sorriso da boca dele ainda cabe o mundo, ela ainda ri por ele. Os olhos dos dois focam pra um mesmo lugar, veem os filhos correndo pra lá e pra cá, descem a escada correndo, levam bronca da mãe, caem, se machucam e tomam o cuidado do pai.
Apreciam sempre, todas as tardes a mesma paisagem, do sol se pondo ao horizonte, o céu avermelhado, o calor, a brisa correndo na pele, nas roupas, nos cabelos. Ela se levanta carinhosamente dali e chama os filhos para tomarem banho, está perto da hora do jantar, ela gosta de ver a família reunida em volta da mesa. Ele a pega pelas mãos, aproxima-a de si, trocam uns carinhos e entram dentro de casa, numa mão o banquinho da cozinha, na outra, a mão da mulher, fecham-se ali.

Marcella Casari

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Um comentário:

Leticia Goes disse...

leve e bem escrito, gostei!