sexta-feira, 19 de novembro de 2010

De Início

Não sei porque eu me aproximei de você. Eu poderia ter escolhido outra pessoa pra conversar, ou eu poderia não ter falado com ninguém. Que é o que eu mais costumo fazer. Eu sou quieta e reservada. Não tinha nada a ver eu me abrir pra você logo de cara. Revelando alguns traços meus. Eu juro que não tinha a mínima intenção de te revelar quem eu era. Por mais ridícula que eu fosse, você me olhava com atenção, ouvia cada palavra que eu dizia e prestava atenção aos meus gestos. Aquilo foi de certa forma cativante, mesmo que eu nem estivesse olhando pra você com outros olhos. Eu apenas não calava a boca.
Eu morri de vergonha apesar de você (inicialmente) não me atrair nenhum pouco. Mas eu sentia que alguma coisa poderia mudar e mesmo assim eu continuava no mesmo assunto e morrendo de vontade de sair dali. Eu estava mesmo é me mostrando pra você, porque esse é um defeito meu. Eu queria te impressionar, me gravar na sua cabeça, mesmo que dali cinco minutos você me esquecesse. Eu não estava nenhum pouco afim de me apaixonar. Mas dali uns dias eu não tive opção.

Marcella Casari 

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terça-feira, 16 de novembro de 2010

Fera Ferida

As vezes eu abro caminho pra uma dor que não tem medida dentro de mim. E nessas vezes eu deixo moscas pousarem sobre a minha ferida, porque quando olho ao meu redor não há ninguém, e minha boca está tão seca, faço o maior esforço do mundo, e não sai nem uma gota sequer de saliva no canto do lábio. Eu peço pro vento soprar, porque minhas mãos se encontram atadas. E a ferida dilacera, corta e arde as partes do meu corpo que eu já não consigo identificar. E é sempre no mesmo lugar. Vira e mexe a ferida despede suas costuras e volta a arder em chamas, suplicando um alívio tão generoso, que não custa a chegar. É uma ferida simbólica, porque os olhos não podem ver, somente o corpo e a alma podem sentir. Você as vezes vem e descostura a ferida pronta a cicatrizar. E começa tudo de novo. Eu sofro, eu choro, eu peço pra você parar. E você para. Pega uma agulha e linha e bem de leve, soprando o ar suave da sua boca, costura a minha pele junta de novo, esconde com um pedaço da minha roupa a ferida pra que eu não veja nem sinta. Mas eu já espero, com a pele descoberta, porque eu sei que você vai abrir o machucado, vai cutucar e desfazer os nós, eu encolho os olhos nas órbitas e peço pra isso parar. Logo logo você me acolhe nos braços e diz que vai ficar tudo bem. E eu gosto disso, eu gosto de estar envolvida entre sua camiseta e sua pele cheirosa, eu gosto de estar presa de onde minhas mãos não podem sair, eu gosto quando os seus lábios vem de leve cutucar a minha bochecha até sair o sorriso mais forte de dentro da minha boca. E a ferida está ali. Mas quem se importa. E a ferida são todas as palavras que você diz, são todas as broncas, são todas as frases grossas, são todas as ordens sem por favor, são todas as vezes em que você me machuca sem querer, são todas as vezes em que você diz coisas que não deveria dizer.


Marcella Casari 


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