sábado, 8 de março de 2008

Catarina

Catarina foi a última a sair do mercado aquela noite; a rua estava escura e Paulo se ofereceu para acompanhá-la, o rapaz trancou a porta do estabelecimento, e guiou-a por aquela rua perdida. Os dois são amigos de infância, viveram juntos na cidade de Cosmópolis e dali em diante sempre mantiveram a amizade. Nina como gosta de ser chamada, mora uma rua acima a de Paulo, sempre são vistos juntos, mas negam qualquer motivo de suspeita, Catarina, é ainda apaixonada por Carlos, irmão mais velho de Paulo, pai de Isabela sua filha, mas Carlos se foi, não foi a morte quem o levou, mas a motivação de uma liberdade.

Nina abriu a porta, uma casa pequena, onde cada cômodo foi decorado apenas com o necessário, tudo sempre no seu lugar, uma organização invejável e que faz a casa parecer imensa. Isabela foi correndo até a calçada cumprimentar Paulo, adorado por ela; ele deu-lhe um abraço bem forte, abraço que sempre recebe dele, somente dele; perguntou à menina como foi seu dia, e como todos os outros, seu sorriso disse tudo, a voz não lha foi dada naquele instante, nem naquele nem em qualquer outro, a menina diz com as mãos que Deus a fez sem voz. Paulo na despedida deu um beijo nas faces das duas meninas, e foi embora, amanhã é um novo dia, e o trabalho não espera a preguiça.
Nina, guardou os sabonetes e as toalhas que comprou, pôs a menina na cama, deu-lhe um beijo e a viu adormecer bem levemente. Isabela é menina abençoada, Deus a criou sem voz, mas a fez forte o bastante para suportar, e sua beleza não se iguala a qualquer tonalidade que ela pudesse ter.

O dia amanheceu bem; Nina foi acordar Isabela, e depois foi preparar um café para beber; Isabela não come nada de manhã, se o fizer fica indisposta, e incapaz de sorrir, sorriso cobiçado pela mãe, a mulher precisa do ânimo. A mãe apronta a menina para a escola, e lá a deixa com a dívida de ir busca-la, as 3h15. Nina volta pra casa e sem desejar derrama seu pranto, suas lágrimas são de dor, pega um lenço e se enxuga, lava a face com a água fria da pia do banheiro e se seca com a toalha nova.
Catarina trabalha como diarista, o dia tirou de folga, sentiu necessidade e marcou uma consulta com seu cardiologista. Reclamou de dores fortes no peito, seu coração parecia querer explodir, e pontadas como se estivesse sendo esfaqueada a fazia sentir falta de ar, tudo num mesmo lugar, bem no centro do peito; os exames, não a fez satisfeita, a declaração final, foi uma saúde perfeita, sem motivos graves de preocupação, apenas a necessidade de se manter calma, mas Nina se considera calma, sem preocupações, a não ser a saudade do infeliz que a abandonou à 7 anos.

Nina cumpre a dívida e vai buscar a menina na escola, como sempre nunca atrasada. Isabela vem andando com calma, seus pés descalços não lhe permitem ir mais rápido, Isabela gosta de sentir o chão, são poucos os instantes em que deixa os sapatos cobrirem seus pés.
Já em casa Nina olha em seu relógio de pulso e vai até a varanda, eram cinco horas da tarde e a vizinha estava saindo; a vizinha sai de casa todos os dias às 5 horas da tarde; Nina não sabe se volta, só sabe que a vê sair, sair sempre sozinha, sempre de carro. Isabela reclama, sua língua de sinais falha quando está nervosa, mas isso motiva ainda mais a mãe para entende-la, Isabela pede a mãe para que a leve para seguirem a mulher, Isa quer entender. Nina nega, não há necessidade em bisbilhotar a vida alheia, Isabela começa a chorar, Nina não resiste e sai atrás da vizinha, já era tarde, não sabiam mais onde ela estava, ou por que rua subiu, ou se desceu. Isabela se contenta e pede para ler o livro que a mãe lê, Nina o entrega e se angustia bem depois que a menina sai, Catarina se pergunta, sente-se curiosa pela vida alheia, foi sua única vez, até então nem percebera que sempre estava à varanda quando a mulher saia de casa.

O dia seguinte foi mais ou menos igual ao anterior, tirando o fato de que Nina não foi ao médico e que transformou sua folga em umas férias de quinze dias.
Fez seu itinerário, e as cinco da tarde foi com Isabela seguir a mulher, Nina sentia fortes pontadas no peito, mas quando a menina lhe perguntava o que havia, a mãe não dizia nada. Catarina e a filha viram a mulher descer do carro e entrar em uma casa, o lugar não era muito longe, mas era cheio de árvores, o que facilitou para que Catarina escondesse o carro atrás de um ipê.
Nina espera por vinte minutos e comenta que desiste e decide ir embora, Isabela não deixa, e lotada de lágrimas nos olhos, cutuca o braço da mãe, e sem fazer gesto algum, a mãe logo como de reação olha para frente e vê a sua vizinha abraçada com um homem alto, magro, de cabelos castanhos e olhos esverdeado, Nina sente seu coração flamejando, não era um homem qualquer, era Carlos. Nina e Isabela, afugentam-se em lágrimas vertentes e frias, a mãe perde o fôlego, Isabela a vê desmaiar, desce do carro, e sem poder berrar, vai até o homem, o puxa com toda força do mundo até o carro, Carlos recua, mas Isabela o convence, o homem reconhece o olhar da menina.
Quando chega no carro encontra Nina e não sabe o que dizer, pois sem saber falar com a menina, não sabe se desculpar. Leva Catarina ao hospital; a jovem falece no meio do caminho, Isabela percebeu a ausência da mãe, sentiu partir o coração. É chamado um médico, e ele dá o atestado, declarando, morte devido a um tumor maligno instalado no coração.
Isabela se irrita do mundo, perde a mãe, e conhece o pai que passava as tardes com a sua vizinha, a ira da menina era como a de uma mulher, estava perdida, mas sabendo que ficaria com Carlos.
A vizinha saía ver meu pai, Isabela pôde escrever em um lenço de papel que lhe deram para enxugar seu pranto.


Marcella Casari

Creative Commons License
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.

Um comentário:

Anônimo disse...

nossa;
que saudade eu tenho de ler os textos que voce escrevia, eu lembro que quando a inspiração vinha voce pegava o celular e ia escrevendo. e nossa melhorando cada vez mais !
maaaaaaaaama;
voce é um tudoo (L)
tudo muito muito lindo !
te amo ;* Rô